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quarta-feira, 30 de junho de 2010

Achei que estávamos a perder mais uma batalha


Achei que estávamos a perder mais uma batalha. Um dos nossos alunos desistiu de ir à escola. Trata-se de um rapaz de poucas palavras. Deveria estar terminando o ensino médio, mas ainda está na oitava série. Foi reprovado dois anos seguidos, estudando na mesma escola. E, devido a uma norma burra que atribui ao aluno a culpa por duas reprovações consecutivas, foi obrigado a mudar de escola. Não adiantou: continuou a ser reprovado. Este ano ainda começou a frequentar a escola, mas menos de um mês depois já tinha desistido de ir à aula.

Soube que está andando com o que nós chamamos de “más companhias”, talvez outros jovens que, como ele, a escola desistiu de tentar “consertar”.

Pois bem. Viajei pensando nesse assunto. Deduzi que não se trata apenas de reintegrá-lo à escola, de salvar o seu ano letivo, mas, quem sabe, talvez salvar sua vida, já que algumas vezes madruga sabe-se lá onde.

A revista Nova Escola deste mês (junho/julho) publicou uma matéria que nos ajuda a pensar sobre a situação deste e de outros jovens brasileiros. A reportagem, que se chama “Um erro que se repete a cada ano”, mostra que, enquanto em todo o mundo a taxa de reprovação no ensino fundamental é de apenas 2,9%, no Brasil é de 18,7%! (ver gráfico acima).

A matéria cita um estudo de Sergei Suarez Dillon Soares, técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em que o pesquisador faz a sábia advertência que reproduzo abaixo:

“[...] Convença um menino de que ele é incapaz e ele o será. Convença-o de que a Matemática ou a leitura estão além do seu alcance, e elas estarão. Reprove-o, sinalizando que sua única alternativa é a escolha entre trabalho braçal e diversos tipos de marginalidade, e ele, principalmente se é pobre e vive cercado de pessoas cujas vidas foram definidas dessa forma, acreditará.”

A matéria faz importantes conclusões sobre a questão da reprovação no Brasil:

“Do jeito que está, espera-se um ano inteiro para confirmar que tudo estava errado. E mais: em lugar de corrigir os erros, repetir tudo novamente. [...] Antes de mais nada, é preciso acabar com a ideia de colocar o estudante como o culpado pelo fracasso escolar. A escola só existe para ensinar.”

Voltei de viagem perturbado com a possibilidade de não pudermos fazer muita coisa por este jovem (devido à burocracia escolar: prazos, notas, etc.). Mas recebi boas novas dos meus colegas de trabalho, que me disseram que o jovem voltou à escola, solicitando a compreensão dos professores: quer concluir o ano letivo. E os professores estão dispostos a ajudá-lo. É um gesto pequeno, quase imperceptível, diante das dimensões do problema no Brasil.

Para mim, a compreensão desses professores é uma atitude que reforça a minha esperança no trabalho educacional. Para o jovem, talvez seja o que faltava para continuar acreditando na vida.

A matéria da Nova Escola pode ser lida clicando o link abaixo:

http://revistaescola.abril.com.br/planejamento-e-avaliacao/avaliacao/repetencia-erro-se-repete-cada-ano-567983.shtml