Excelências.
Empresa de excelência.
Escola de excelência.
Excelência pessoal.
Excelências.
O conceito está por aí, persuadindo-nos que basta seguir alguns procedimentos e a excelência virá.
Virá?
A excelência contraria o óbvio: a imperfeição de que são constituídos os seres humanos, saudosos de um não-sei-o-quê que sempre nos acompanha.
Somos excelentes em nossas imperfeições.
Se não nos enquadramos no script da excelência, somos menos gente? Somos tão-somente um empecilho, carta fora do baralho? Mesmo que o roteiro nos reserve o papel de desentendido dos outros e algoz de si mesmo? Encaixe-se; ou será substituído.
Qual o preço dessa excelência? “Tome estas pílulas”, disse o médico da empresa ao meu taciturno amigo, num dos poucos dias em que este rapaz decidiu ser mais falante com os colegas de trabalho. “Você parecia alterado”, disse o médico ao meu amigo, que continua consumindo as milagrosas-pílulas-pró-excelência-empresarial.
O “excelente” professor de matemática da Escola Normal da minha infância ia aos sábados levar problemas para o meu pai resolver… Meu pai, que andava longe da excelência paterna, andava misteriosamente próximo duma suposta excelência matemática, mesmo tendo vivido na roça e mal concluído o primário… Não sabemos, talvez nunca saibamos, como é moldada a matéria de que nos constituímos...
Sei que somos insubstituíveis, pois mesmo que reponham a peça que você é, a nova peça será feita de outro material: a coisificação de outras experiências. Logo, você não estará sendo substituído. Cada ser humano é uma peça única: daí sermos insubstituíveis.
No Nordeste, excelência virou incelença. Mui interessante. Mudaram-se os prefixos: o ex (para fora) se transformou no in (para dentro). A incelença não é algo para “se amostrar”, mas para se viver, para se consolidar.
Ou para se rememorar, como algo que nos constituiu, como as incelenças, cantigas de sentinelas, benditos de defuntos…
… Tão gostosamente de se ouvir também — incelença — para o trato das autoridades que estão léguas e léguas distantes da excelência como pessoas boas…
Daí eu cantar incelenças: não só para o que se perdeu, mas para a vida, e para o que em nós buscamos: não a perfeição, mas o mistério.